terça-feira, 17 de abril de 2012

Samba da Vela

Quem nasceu e viveu em cidade grande talvez não entenda o que eu quero dizer. Quem nunca se sentiu pertencente a um grupo, um lugar, uma causa, também não.

Eu, que tenho me tornado um ser meio sem parada nos últimos tempos, tenho tido cada vez mais dificuldade em me sentir "em casa" nos lugares que frequento.

Sentir-se em casa implica várias coisas. É a familiaridade com o lugar, com as pessoas, com o assunto. É ser acolhido, perceber-se bem vindo, mesmo que ninguém o diga. É fazer parte, de alguma forma, ainda que não se faça nada - basta estar.

Ter esta experiência nesta cidade enorme que é São Paulo é raro - e privilegiado. Não sei se é assim para quem vive em bairros mais populares, onde as pessoas se conhecem e formam uma comunidade, mas para quem é forasteiro e vive nas regiões mais adensadas e impessoais - como eu - isso é muito, mas muito difícil. Tenho a impressão, às vezes, que se eu desaparecer, ninguém vai dar pela minha falta.

Toda esta volta, esta introdução, é para falar da simpatia e carinho que tenho pela Comunidade do Samba da Vela. Numa segunda-feira à noite, um espaço público lindo, como a Casa da Cultura de Santo Amaro, é ocupada por gente que quer celebrar a boa música, a beleza da palavra, da melodia, e - o mais belo - o encontro e a alegria da partilha desta beleza. E este ambiente, acolhedor e familiar, aceita com muita espontaneidade e generosidade gente "de fora", como eu.

Falar da alegria da roda de compositores, da magia que existe cada vez que um samba "pega" entre os músicos e o público, é insuficiente. Tem que estar lá para ver. Vozes tímidas que são impulsionadas por outras mais experientes, vozes pra lá de experientes que dão o tom aos mais novos... gente que toma coragem e traz para o centro da roda seus sentimentos, seus pensamentos, e, por que não?, suas piadas e brincadeiras. O arranjo que surge ali, no meio da descoberta, o samba que de repente se torna de todos - e o compositor é tomado pela surpresa de ver seu filho crescer e tomar forma própria.

Para o público, é sempre um privilégio conhecer os compositores, os personagens deste movimento que mantém a chama do samba acesa pelo país, apesar de todas as dificuldades. Para mim, que descobri na roda de samba um alimento para a alma - é quase uma transfusão de sangue! - frequentar uma roda de compositores é oportunidade de fartar-me, provar de iguarias únicas. E além disso, ser recebida por olhares simpáticos, sorrisos, cumprimentos simpáticos. Compartilhar sinais de aprovação, empolgação, aplausos por vezes emocionados. Eu fico olhando ao redor, tentando saber se todas as pessoas se conhecem, e reconheço olhares estrangeiros como eu, igualmente felizes por poder participar daquela celebração.

Vida longa, minha gente, à celebração da vida, do samba, da cultura popular brasileira! Vida longa ao Samba da Vela!


Nenhum comentário:

Postar um comentário