terça-feira, 28 de dezembro de 2010

balanços

Foi um ano de muitas mudanças. Muitas novidades. Cidade nova, casa nova, trabalho novo. Oportunidade de recomeçar, de refazer, de inventar.

Um ano longo, intenso, feliz - apesar de tudo.

Independência, acolhida, reencontros, descobertas. Encarar essa cidade enorme e dura sozinha, e descobrir em suas esquinas a doçura de se sentir em casa - mesmo que isso às vezes tenha sido à custa de lágrimas. Fazer novos amigos, e reencontrar antigos - amizades adormecidas, que só aguardavam para serem despertas. Aprofundar relações - e descobrir pessoas belas. Descobrir o amor, de uma maneira única - ainda que dolorido, e ter esperança na força do tempo.

O balanço de 2010 é bom. O ano foi ótimo.

Que venha 2011, com tudo o que tenho plantado. Eu confio na colheita.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

post script

um dia de ressaca
e não é por conta do álcool

um dia de ressaca
mas, ao contrário do mar,
que se joga contra o continente
de maneira violenta
eu recuo, e me guardo,
e fujo, e silencio

um dia de ressaca
somente mais um dia de ressaca
a boca guarda o gosto bom do ontem
o amargo do hoje
e a secura, o vazio, a fome de amanhã

inundações à vista

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

considerações noturnas

eu te amo.
isso eu já sei, você já sabe, todo o mundo sabe.
fico procurando razões, explicações, desculpas
para este hiato, que eu quero que seja temporário.

procuro por sinais na terra, nos céus, no mar.
dentro de mim, só há certezas.
de que fomos feitos um para o outro, nada mais.

encontros outros, felicidades passageiras
nada me desvia
são como a chuva passageira, que só acaricia o solo
mas não mata a sede da plantação

estou atravessando a ponte,
e você não é ela.
você é o que está no final da ponte,
a minha chegada.

meu pote de ouro no final do arcoíris.

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

Sobre o que é o amor - Por Carpinejar

O amor nunca morre de morte natural. Añais Nin estava certa.


Morre porque o matamos ou o deixamos morrer.

...Morre envenenado pela angústia. Morre enforcado pelo abraço. Morre esfaqueado pelas costas. Morre eletrocutado pela sinceridade. Morre atropelado pela grosseria. Morre sufocado
pela desavença.

Mortes patéticas, cruéis, sem obituário e missa de sétimo dia.

Mortes sem sangramento. Lavadas. Com os ossos e as lembranças deslocados.

O amor não morre de velhice, em paz com a cama e com a fortuna dos dedos.

Morre com um beijo dado sem ênfase. Um dia morno. Uma indiferença. Uma conversa surda. Morre porque queremos que morra. Decidimos que ele está morto. Facilitamos seu estremecimento.

O amor não poderia morrer, ele não tem fim. Nós que criamos a despedida por não suportar
sua longevidade. Por invejar que ele seja maior do que a nossa vida.

O fim do amor não será suicídio. O amor é sempre homicídio. A boca estará estranhamente carregada.

Repassei os olhos pelos meus namoros e casamentos. Permiti que o amor morresse. Eu o vi indo para o mar de noite e não socorri. Eu vi que ele poderia escorregar dos andares da memória e não apressei o corrimão. Não avisei o amor no primeiro sinal de fraqueza. No primeiro acidente. Aceitei que desmoronasse, não levantei as ruínas sobre o passado. Fui
orgulhoso e não me arrependi. Meu orgulho não salvou ninguém. O orgulho não salva, o orgulho coleciona mortos.

No mínimo, merecia ser incriminado por omissão.

Mas talvez eu tenha matado meus amores. Seja um serial killer. Perigoso, silencioso, como todos os amantes, com aparência inofensiva de balconista. Fiz da dor uma alegria quando não restava alegria.

Mato; não confesso e repito os rituais. Escondo o corpo dela em meu próprio corpo. Durmo
suando frio e disfarço que foi um pesadelo. Desfaço as pistas e suspeitas assim que termino o relacionamento. Queimo o que fui. E recomeço, com a certeza de que não houve testemunhas.

Mato porque não tolero o contraponto. A divergência. Mato porque ela conheceu meu lado escuro e estou envergonhado. Mato e mudo de personalidade, ao invés de conviver com minhas personalidades inacabadas e falhas.

Mato porque aguardava o elogio e recebia de volta a verdade.

O amor é perigoso para quem não resolveu seus problemas. O amor delata, o amor incomoda, o amor ofende, fala as coisas mais extraordinárias sem recuar. O amor é a boca suja. O amor repetirá na cozinha o que foi contado em segredo no quarto. O amor vai abrir o assoalho, o porão proibido, fazer faxina em sua casa. Colocar fora o que precisava, reintegrar ao armário o que temia rever.

O amor é sempre assassinado. Para confiarmos a nossa vida para outra pessoa, devemos saber o que fizemos antes com ela.

Fabricio Carpinejar

quinta-feira, 9 de dezembro de 2010

Emprestando palavras pra expressar mistérios...

Tem hora que a gente não acha palavra pra dizer o que se sente... daí a gente tropeça, sem querer, em algo que outra pessoa escreveu de um jeito tão maravilhoso, como se estivesse sentindo dentro da gente mesma.

A Silva Tavano faz isso muito bem. E eu empresto este texto dela (sem pedir!) pra colocar aí embaixo...

09/11/2010


Das cismas

A cisma é uma ideia fixa que fica teimando em se provar. Muitas vezes, ela não é nada, só acha que é. Isso acontece com a cisma que é prima do pressentimento, mas gosta de se apresentar como filha da certeza. Ela também costuma ser amiga íntima da desconfiança. Quem leva esse tipo de cisma a sério acaba implicando com coisas e com pessoas sem motivo nenhum. O problema é que, de vez em quando, o motivo aparece e a cisma se confirma. Aí, ninguém segura. Cheia de razão, a danada pode resolver dar palpite o tempo todo, por puro capricho, e acaba embaçando a percepção da gente. Quem cisma demais sempre empaca, embirra e antipatiza com o que nem conhece.
Mas existe um outro tipo de cisma. Essa até pode ser alguma coisa, apesar de ela mesma nem sempre botar muita fé nisso. Também inventa ideias e impressões pra ficar cismando, insistente. Tem que prestar atenção, porque, aqui, é tudo diferente -- essa cisma é prima do desejo, filha do sonho e pode virar a melhor amiga da perseverança quando a gente decide encarar o tira-teima.    
       
(ST)   

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

Sorte e Azar

Eu nunca jogo.
Nem com a Mega acumulada, loteria esportiva com resultado anunciado, jogo do bicho depois de um sonho explícito, rifa de chocolate, nada.
Sou tremendamente azarada, é sempre dinheiro perdido tempo perdido.
Sou cética, e acho que, quando há sorte, ela vem bater à porta.

Pois é, ela às vezes vem mesmo.
Bate à porta, entra, se acomoda.
Ainda desacreditando, porque era muita sorte, presente mesmo, pra uma pessoa só.
Pessoa cética.
Daí que um dia - demorou um pouquinho - cai a ficha:
- Você ganhou. Acertou o jogo todo. Sozinha.
Parece sonho.
Fazia tanto tempo que eu tinha feito essa fézinha...

Tanto tempo, rá!
Perdi o bilhete.
Não sei onde o guardei.
É como eu sempre pensei: sou azarada demais.
Até quando ganho na Mega, sozinha
Não fico com o prêmio.

terça-feira, 23 de novembro de 2010

por entre sonos e sonhos

nosso encontro foi como um sonho
a confirmação do premeditado
do que já estava escrito
já estava arranjado

tenho medo de sonhar
e acordar na melhor parte
fui em busca de trazer para o lado de cá
fazer do sonho, realidade

tornar tudo palpável
factível, possível
e me dei conta de que a realidade
era muito mais interessante do que o sonho

mas enquanto eu cuidava disso
você se afundou em sono profundo
e parece estar num pesadelo



De Oriente a Occidente @ Jovisur

Joana Francesa - Chico Buarque

Mata me de rir
Fala me de amor
Songes et mensonges
Sei de longe e sei de cor
Geme de prazer e de pavor
Já é madrugada
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda
Acorda, acorda, acorda
Quem me enfeitiçou
O mar, marée, bateau
Tu as le parfum
De la cachaça e de suor
Geme de preguiça e de calor
Já é madrugada
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda
Acorda, acorda, acorda
Vem molhar meu colo
Vou te consolar
Vem, mulato mole
Dançar dans mes bras
Vem, moleque me dizer
Onde é que está
Ton soleil, ta braise
Quem me enfeitiçou
O mar, marée, bateau
Tu as le parfum
De la cachaça e de suor
Geme de preguiça e de calor
Já é madrugada
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda
Acorda, acorda, acorda
Vem molhar meu colo
Vou te consolar
Vem, mulato mole
Dançar dans mes bras
Vem, moleque me dizer
Onde é que está
Ton soleil, ta braise
Quem me enfeitiçou
O mar, marée, bateau
Tu as le parfum
De la cachaça e de suor
Geme de preguiça e de calor
Já é madrugada
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda,
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda,
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda,
Acorda, acorda, acorda, acorda, acorda.

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

uma estranha sensação

acho que eu já sabia o que você ia me dizer
e uma estranha sensação de calma me invadiu
ou seria uma certa apatia?
estado de choque, talvez?

é como se eu assistisse aos acontecimentos através de uma vitrine
e a mim só restasse aguardar
de maneira paciente e comedida

não tem mais volta
não consigo
não há mais nada que eu possa fazer
esqueci de marcar o caminho com pedrinhas
só me resta ir adiante

espero que ao seu lado, se você me permitir

sábado, 13 de novembro de 2010

um dia de inverno em pleno novembro

se até o tempo anda amalucado
se as estações estão confusas e eu preciso de cachecóis e meias em pleno novembro
se ninguém mais sabe se vai chover ou fazer sol
quem sou eu para buscar alguma certeza entre os homens?

esperando, espreitando
mantendo tudo em banho-maria
cuidando para não derramar nem queimar

olhando por entre as frestas que ainda estão abertas
e tentando juntar, à minha maneira, os fragmentos daquilo que me chega
procurando fazer dos ruídos, sinfonia

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

???

Eu tenho uma pulga
enorme, gigante, monstruosa
que mora atrás da minha orelha

ela vivia no circo até bem pouco tempo atrás
então sabe muitos truques
como ficar bem pequenininha
de um jeito que eu me esqueço da sua existência

mas quando ela teima em reaparecer

quer o picadeiro inteirinho
só para ela
ah, como é exibida!

"uma pulga na balança deu um pulo e foi à França!"

não ando nos meus dias mais amigáveis com os animaizinhos
quero me livrar de você pulga, vai fazer seu show em outro lugar...

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

eu espero acontecimentos

tantas coisas
tantas coisas
tantas coisas...
pensamentos infindáveis, conexões intermináveis, neurose, histeria
sufoco, penso, respiro, decido
o coração na boca
a cabeça (ainda) em cima do pescoço
- para onde mais ela poderia ir? -

procuro pelas respostas
mas acho que estou fazendo as perguntas erradas

Baby, do you wanna dance?

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Silêncio

quando o silêncio faz um barulho ensurdecedor
ele vibra dentro de mim com uma força descomunal
é maior do que centenas de alfaias num maracatu na rua
ou do que a bateria da escola de samba
é mais forte do que as ondas do mar em dia de ressaca
ou do som aterrador da turbina do avião dentro da turbulência

seu silêncio grita dentro de mim
e eu não posso fazer nada
pois tudo o que eu mais quero
é fazê-lo falar
e para isso
seria preciso fazê-lo calar

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

problemas de comunicação

Em tempos de comunicação em tempo real, digital, via rádio, celular e outros meios sobrenaturais, a compreensão entre dois seres humanos continua difícil. Nada substitui o olho-no-olho, e o tempo necessário para se elaborar ideias e dizer da melhor maneira possível aquilo que ainda ganha forma dentro do espírito, sem se definir.

terça-feira, 14 de setembro de 2010

num dia trovão
no outro calmaria

o fogo que ontem me consumia
hoje é brasa que mantém a casa quente

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

***

o que fazer
quando o cheio
de tão repleto
faz sentir um vazio
quase existencial?

esvaziar por completo
até voltar ao vazio inicial?
(e ficar novamente sem sentido)
ou descobrir espaços
para que o cheio ocupe
sem apertar nada nem ninguém
e ter o seu sentido garantido?


terça-feira, 31 de agosto de 2010

neste momento

Quando pensei que estava tudo no lugar, tudo certo, tudo seguindo como o planejado, você me apareceu. Furacãozinho na minha vida, como você mesmo costuma dizer.
Desordem imensa, bagunça total. E tomou espaço sem pedir licença, foi entrando, se acomodando.
Eu nem dei por mim. Fui deixando, fui gostando.
Tinha um espaço tão grande, e há tanto esquecido, que foi como o sol entrando e ocupando tudo, imenso, enorme, brilhante.
Não fiz cálculos, não pensei, não temi. Abri a porta pra você.
Agora me sinto dividida, entre o prazer e o temor. Experimento uma felicidade que nunca senti antes, e um medo de que ela seja ilusória, passageira, frágil.
O furacão não sou eu, não é você.
O furacão é a vida, e ela carrega tanta coisa dentro do redemoinho, que a gente não escolhe.
Estaremos nós dois aqui, depois que o furacão passar?
Sinto um medo do tamanho desta felicidade, um medo do tamanho do mundo, do tamanho da vida.
Medo de perder o que eu nem bem acabei de encontrar.
Se eu não encontrar você, não me acho nunca mais.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Estar viva

... apaixonada. Pura e simplesmente.

Pela vida, pelo momento que estou vivendo.

Pela arquitetura da cidade, que aos poucos vou descobrindo.

Por mim mesma, por tudo que vou alcançando e conquistando.

(e por alguém que tem me feito ver e sentir tudo isso junto-e-misturado)

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Cenas invisíveis

A cidade é rápida demais. Anda-se de um lado para o outro, sem se observar o que há pelo caminho. Cada qual com seu itinerário, com o tempo do relógio acelerado, com o relógio interno perdido. Ninguém se olha. Não há troca, não há encontros. Os olhares são vazios, olha-se através, para além. Para onde? Eu ainda não sei, e acho que não quero descobrir.

Segunda-feira, meio-dia. Caminho pela Avenida São João, procurando um cabideiro nas lojas de móveis usados. A quantidade de pessoas morando embaixo do Elevado me impressiona. Famílias inteiras, uma vizinhança formada. Mulheres, crianças. Faz muito frio, e muitas pessoas ainda dormem, apesar do trânsito e do barulho ensurdecedor. Confesso que fico apreensiva, e não sei muito por onde caminhar, como andar por ali. Envergonho-me disso. Quero olhar para aquelas pessoas, mas fico constrangida - quero olhar por quê? Caminho na calçada, acompanhando o comércio, e vejo muitos homens nestas calçadas, mendigando na porta das lojas. Os pedestres passam sem olhar. As pessoas desviam dos corpos como quem desvia do lixo, da merda dos cachorros. Apesar da minha indignação, fico paralisada. Não sei se continuo a caminhar por esta calçada, se atravesso a rua, tenho medo de passar embaixo do Minhocão. Mais uma vez, envergonho-me do meu medo. Sinto que me igualo às pessoas que passam sem olhar. A impotência nos animaliza.

Domingo, dez horas da manhã. Atravesso a rua para chegar ao trabalho, e vejo dois meninos, aproximadamente de 10 anos, descendo a rua correndo. Eles tem chinelos e sapatos velhos nas mãos, e gritam palavrões para um senhor de idade que atravessa a rua na direção contrária, visivelmente amedrontado. As pessoas no ponto de ônibus estão agitadas, incomodadas, mas silenciosas. Ninguém se olha, com medo de encontrar um olhar. Os meninos atiram os sapatos nas janelas do ônibus que está parado no sinal fechado. Riem um riso doente, sarcástico - não é uma risada de crianças. O riso deles me incomoda. O horror nos olhos dos adultos dentro do ônibus e na rua me incomoda mais ainda. Continuo parada na calçada, olhando para os meninos, mas eles passam por mim sem me perceber. Recuso-me a ter medo de crianças, sejam elas quais forem e de onde vierem. Os meninos seguem pela avenida movimentada, aterrorizando os transeuntes. Mais uma vez, sinto-me impotente perante a situação. Na portaria do trabalho, há alguns metros dali, ninguém percebeu a cena que acabara de ocorrer.

Terça-feira, vinte e uma horas. Caminho em direção à minha casa, experimentando novas ruas, para conhecer melhor o bairro. Descubro lanchonetes, farmácias, pizzarias, bares. Há uma vida noturna, happy-hours acontecendo em vários lugares. Está uma noite agradável, tem jogo de futebol na televisão, grupos se confraternizam. Passo por uma pizzaria, entro para pegar o número do disque-pizza - pode ser útil a qualquer hora dessas. Na esquina seguinte, um rapaz - provavelmente com a minha idade - está agachado no chão, revirando os sacos de lixo. Tenho vontade de atravessar a rua, mas não dá - estou muito próxima, e poderia chamar a sua atenção. Ele, no entanto, nem percebe a minha presença. Diminuo o passo, e tento ver o que ele faz. Vejo uma caixa de esfirras, com restos, e ele a retira do saco de lixo. Olho em frente, miro o horizonte, e sigo acelerada. Acho que, sem querer, descobri para onde se olha, no através.

Quinta-feira, dezenove e trinta. Sigo a pé para minha aula de dança, caminhando rápido para não me atrasar. Estou alerta, pois a rua, apesar do movimento dos carros, tem poucos pedestres. Há muitas pessoas nos pontos de ônibus, e muitos sacos de lixo do comércio espalhados pelas calçadas. É preciso desviar deles, sair da calçada por vezes. Os tapumes das obras atrapalham, impedem a visão total da rua, e isto me incomoda. É cedo, mas acho tudo muito escuro - o desconhecido é sempre escuro, faz parte da estranheza. Um homem bêbado grita na porta de uma casa, esbraveja, pragueja. Imagino que a mulher o tenha colocado para fora. Ele tenta falar comigo, mas minha insegurança faz com que eu apresse o passo e o deixe falando sozinho - péssimo. Talvez ele só quisesse um minuto de atenção. Meu receio, meu medo são maiores. Ouço um balbuciar misturado com uma cantiga ininteligível. Olho para os lados e não vejo nada. Procuro de novo e vejo, do outro lado da rua, uma mulher sentada na soleira de uma loja brincando com um bebê sentado à sua frente. Há tantos sacos de lixo na calçada, que eu demorei a vislumbrá-los ali. Não sei se a mulher é jovem ou velha; vejo apenas seus cabelos desgrenhados, presos desajeitadamente, maltratados. Suas mãos são magras, e eu vejo isso do outro lado da rua. Não vejo o rosto do bebê, imagino que tenha cerca de um ano. Ela canta algo que não compreendo, e eu tenho receio de andar sozinha por aqui, apesar do horário, e não posso parar para observar. Também não quero que ela me perceba e fique zangada. Vou embora imaginando quem serão eles, e porque estão ali. Penso que esta cidade é muito injusta, e que não há nada que se possa fazer. 

Penso que pensar assim é ficar invisível também.

domingo, 8 de agosto de 2010

Olhares

Tenho reparado que as pessoas não se olham nesta cidade. Todo mundo anda pelas ruas sem trocar olhares, sem ver. Andando pelo centro da cidade, perto do Mercadão, recebi várias retribuições com olhares agradecidos – e surpresos – porque dava passagem na calçada para quem estava com bagagem, ou para pessoas mais velhas. Uma senhora chegou a voltar para me agradecer – ela vinha empurrando um carrinho com recicláveis, e eu desci da calçada para que ela passasse.

Percebo que ao olhar, sustentar o olhar com as pessoas que encontro pelo meu caminho, ganho sorrisos – a maior parte deles espontânea. Algumas pessoas ficam constrangidas – desaprenderam a compartilhar. Um olhar incomoda, a gente se acostuma tanto a viver fechado, que quando alguém nos encara, é como se nos abrisse à força.

Gosto de encontrar olhares. É meu mais novo jardim a ser cultivado.

Descobrindo a cidade #3

Saí de casa resolvida a encontrar meu cabideiro e, quem sabe, inspiração para o rack da sala. Fui ao Bazar do Lar Escola São Francisco, na Vila Mariana. Eu já havia pensando em ir lá, mas ontem, quando me disseram que fica na rua França Pinto – a mesma da Livraria Nove Sete – descobri que era mais fácil do que eu imaginava.

Uma das coisas que mais me encanta em São Paulo é poder ser apenas mais uma na multidão. A gente pode estabelecer relações familiares nos espaços que freqüenta, mas ser apenas mais um pelos caminhos. Adoro. Já senti isso na Avenida Paulista, no centro, no Ibirapuera, na Vila Madalena, aqui na Pompéia. Ou ninguém repara em você – porque se está em uma multidão; ou há tantas pessoas diferentes e de variados estilos, que você se torna mais uma.

Mas isso não acontece na Vila Mariana. Andando pelo bairro, hoje, senti que as pessoas me olhavam, incomodadas. Motivo: minha meia-calça verde. Perto da hora do alomoço, as famílias estavam comprando almoço, saindo para almoçar, movimentando o bairro. Para minha surpresa, aquelas mulheres (com suas bundas enormes, usando legging, bota de montaria, num gosto bastante duvidoso) ficavam me encarando, me olhado de cima a baixo... cruzes! Senti-me em Berti city...

Bom, o que importa é que encontrei o meu tão sonhado cabideiro de imbuia, inteirinho, bonitinho. Está meio sujo, amanhã dou uma geral nele e levo para o quarto. O rack, nenhuma idéia.

Mudando de assunto, fui assistir Policarpo Quaresma. É ótimo, tem sequências de cenas ótimas – a cena do manicômio é impagável. Mas, assim como em A Pedra do Reino,  a sensação ao final é de que foi muito longo – são duas horas de espetáculo. Podia ter enxugado alguma coisa, sei lá. Mas que é bom, é mesmo.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Descobrindo a cidade #2

Eu tenho a pretensão de conhecer esta cidade. Sou muito pretensiosa, admito. Mas se não o for, estou condenada a me esconder nos caminhos fáceis ao redor das estações de metrô, ao óbvio, e àquilo que todo mundo vê. É pouco, certo?

Ontem, dia de folga, jornada ao centro da cidade. Tomei um ônibus aqui perto de casa e rumei para a Avenida São João - já aprendi a descer próximo à estação Marechal, sem ficar com aquela cara de pessoa perdida dentro do ônibus, que atrai olhares piedosos dos outros passageiros... ;-) Missão: percorrer as lojas de móveis usados, em busca de um cabideiro, uma açucareiro de louça, e descobrir coisas legais para o meu apê. Perda de tempo. As lojas são caríssimas, todas com pinta de "antiquário" - impossível gastar pouco nelas. Só encontrei o cabideiro em uma delas, por um preço razoável - um pouco acima do que eu queria pagar ainda, mas em bom estado. Cadeiras, cômodas, poltronas - esquece! Tudo virou artigo de luxo das revistas de decoração descoladas... Uma senhora queria me vender um açucareiro detonadinho por R$40,00, vê se pode!!!

Mas o que mais me impressionou na verdade foi a paisagem do Minhocão. Agradeço mais uma vez aos anjos que me mostraram este apartamento, porque eu não ia dar conta de morar naquela região. Gente, é pesado demais. Onze horas da manhã, e as calçadas lotadas de moradores de rua. Frio, garoa, e pessoas nas condições mais tristes e indignas possíveis. Andando pelas calçadas laterais, é impossível não ficar indignado, sentir-se oprimido, envergonhado, com aquela situação. E eu, que me considero uma pessoa razoavelmente tranquila, tive medo. Em cada esquina para atravessar, eu ficava insegura, sem saber se devia ficar parada aguardando o semáforo abrir, se devia me jogar no trânsito - como a maioria dos pedestres acelerados fazem - se mudava de calçada, se passava pelo canteiro central do Elevado. Uma droga. O ar é pesado, tudo que eu conseguia pensar era que queria sair dali, que precisava ver mais luz, e que ia precisar de incenso e banho de sal grosso quando chegasse em casa. Triste, muito triste.

Subi a São João toda, até cruzar com a Ipiranga. Meu roteiro inicial eral São João, Sé (rua do Carmo - Casa das Essências), Twenty-five e estação Júlio Prestes, para ver a exposição e tomar o trem para casa. Chegando lá em cima, resolvi desistir da Sé, e me encaminhei para a Meca das compras dos pobres de recursos mas não de espírito. Passei pela Santa Efigênia pra comprar um pendrive baratinho e muambado, e me joguei na 25. Incrivelmente, estava tranquila. Andei por muitas lojas, encontrei boa parte das coisas que precisava, um açucareiro de cerâmica branca basiquinho por honestos R$9,00 (hello dona antiquária!!!). Não comprei os tecidos para as almofadas, porque não achei loja de retalhos - pedaços de tecido mesmo, ainda quero uma indicação, please! E também não comprei panelas - este assunto está ficando MUITO complexo!!! Juro que não sei o que comprar neste capítulo...

Fui até o Mercado Municipal, na esperança de encontrar ervas para banho - mas lá não tem. Assim como o Mercado da Lapa, que visitei na semana passada - só se encontra comida, para comer lá ou fazer, e cara, muito cara. Andei pela Rua Cantareira, mas não encontrei a Rua do Gasômetro, que um vendedor da São João me indicou para procurar banquinhos, cabideiros e etc. (acabei de descobrir que é um pouco longe pra ir caminhando... santo google maps!).

Resolvi subir a pé de volta para a parte do centro que conheço - República, Arouche - e, adivinha?!? Me perdi, lógico! Comecei a andar por ruas que conhecia por nome, mas, de verdade, não sabia onde estava. Frio, frio, frio! Esta cidade cinzenta, as pessoas apressadas, e eu sem a menor idéia de onde estava, pra que lado ir. Fui caminhando meio sem rumo, passei pelo Pátio do Colégio (nota: eu sabia que estava no centro, mas não encontrava uma referência conhecida para me localizar no espaço, entende?), pelo Largo São Francisco... fui andando, até que avistei as janelinhas do Shopping Light. Eureca! Me dei conta que nunca havia atravessado o Viaduto do Chá, e por isso estava perdida. Mais um link no meu mapa mental da cidade.

Bom, chegando ali, estou em casa. Sei onde tomar ônibus pra Lapa que passa pela Guaicurus, onde tomar café quentinho com VR, onde comprar incenso - e encontrei as benditas ervas que estava procurando há duas semanas. Cheguei aqui, tomei banho, descarreguei, e fui me encontrar com o Carlinhos.

Nova expedição: chegar à Rua Rui Barbosa à noite, na UESP (União das Escolas de Samba de SP). Ok, parece fácil - quando se conhece o lugar de dia. À noite, com garoa, e sendo astigmática - tudo fica terrivelmente assustador. Mas eu cheguei direitinho, encontrei o Carlos - e as pessoas me olharam como se eu fosse namorada dele, hahaha, ganhei meu livro, e fomos jantar pelo Bexiga. Vim pra casa no último horário do metrô. Muita aventura pra um dia só.

PS: o livro do Carlos se chama Um Batuque Memorável no Samba Paulistano, e foi uma pesquisa financiada pelo Centro Cultural São Paulo. Ainda estou lendo, e estou me deliciando. Tem tudo no site, vale a pena conhecer.

Hora de dormir, que a cidade não para! Fui!

domingo, 1 de agosto de 2010

Descobrindo a cidade #1

Minha primeira semana nesta cidade foi em horário alternativo, para descobrir/conhecer/entender a dinâmica de trabalho.

A segunda semana foi no horário definitivo, com o núcleo, para começar a dividir tarefas e vislumbrar minhas novas funções e desafios.

Esta que começa hoje, com folga amanhã para colocar a casa em ordem, posso considerar minha primeira semana em São Paulo, vivendo a cidade.

Estou aqui, olhando para os guias culturais publicados nos jornais, sem saber por onde começar. Há o que fazer todos os dias, em todos os horários. A cidade não para.

Coisas para fazer nesta semana - e nas seguintes, porque nunca vai dar tempo de fazer tudo:

- Passear pela Avenida Paulista, com um guia em áudio - Circuito Anônimos-SP, criado pela Núcleo Corpo Rastreado. O guia pode ser baixado no site do projeto para o seu próprio MP3. Tive a experiência de fazer um audiotur ficcional, com a Difusa Fronteira, no SESC Bertioga, que era MUITO legal. Fico empolgada para conhecer este roteiro, com trabalho que me parece semelhante. A conferir.

- Cinema: muitos filmes legais em cartaz. A fita branca e Medos privados em lugares públicos (que ainda não sairam de cartaz, e eu preciso dar um jeito de assistir); Uma noite em 67 e  Dzi Croquettes; Flor do deserto e As melhores coisas do mundo. E as animações Mary e Max e Ponyo - que a crítica diz ser mais fantástica do que A viagem de Chihiro, que eu adooooro!!! Estou curiosíssima para assistir O pequeno Nicolau - o livro é daquelas delícias que a gente lê numa sentada e se diverte muito; agradeço até hoje à professora de francês que nos apresentou essa maravilha. E ainda tem a 4ª Jornada Brasileira de Cinema Silencioso, na Cinemateca, com acompanhamento musical ao vivo - mais uma das curadorias interessantíssimas de Lívio Tragtemberg. Ufa! Impossível em uma semana. Uma parte disto vai ser vista em dvd, com toda a certeza do mundo...

- Teatro: a estréia de "Fatzerbraz", numa montagem tropicalista a partir do texto de Bertolt Brecht. Este eu verei com certeza, pois estarei em casa. Até o final de setembro, "A filosofia na alcova", montagem famosa dos Sátyros, eu tenho vontade de assistir faz tempo - preciso me programar. E a montagem de Antunes Filho para Policarpo Quaresma, que fica só até o final do mês - e o teatro Anchieta está sempre lotado.

- Dança: o Festival Palco Giratório 2010 traz a Mimulus Cia de Dança, de Belo Horizonte, ao SESC Santo André, com o espetáculo "Dolores". Só assisti aos espetáculos deles em vídeo, gostaria muito de ver ao vivo. Sexta e sábado - despencar até Santo André? quem sabe...

E muitas, muitas exposições - e eu tenho a pretensão de apreender a cidade através delas (hahahahaha). O MAM Ibirapuera traz até o final do mês "Ecológica", cujo nome já me dá preguiça, antes mesmo de ler o release: "os 22 trabalhos falam da preservação da natureza e fazem crítica ao consumismo" (revista sãopaulo, folha de são paulo, 1/08). Que medo, hein? Vamos lá ver do que se trata. Ainda na classificação "ambiental" - que preguiça do rótulo! - ,  as individuais "Mare Incognitum", de Marcelo Moscheta, no Maria Antônia, e "Os últimos verdes", do baiano Marepe, na Galeria Luísa Strina. Na Caixa Cultural Paulista, a festejada exposição de Keith Haring - para ver antes da visita audioguiada pela Avenida Paulista, há! E "Cortiços - redesenhando espaços de (sobre)vivências", com fotos de Fabio Knoll, com curadoria de Maureen Bisilliat, na Estação Júlio Prestes. Ufa!

E na missão "conhecer a vizinhança", quarta-feira tem Espaço da Cultura de Consumo Responsável, no Tendal da Lapa.

Semaninha agitada, pelo menos no planejamento. Amanhã é dia de Avenida São João, em busca de algumas coisinhas interessantes e estilosas para a casa, e 25 de Março, para coisas necessárias e bem baratinhas para uso imediato. Eu preciso comprar panelas!!!

Ao longo da semana vou contando o que consegui ver, e o que valeu a pena dessa agenda toda aí.




quarta-feira, 28 de julho de 2010

Voltei a rezar.

Fiquei um bom tempo sem conseguir rezar, sem repetir uma oração que fosse. Achava sem sentido, não sabia a quem me dirigir, o que pedir, para quem agradecer. Questões existenciais com um Deus homem, com o cosmos, com a cultura ocidental judaico-cristã.

Às vezes sentia necessidade de me dirigir a alguém, mas acabava por recriminar-me a mim mesma - como posso ter as minhas questões existencias e na hora do aperto sair rezando e pedindo por socorro ou por soluções milagrosas, mágicas? Era contra o meu racionalismo.

Nas buscas transcendentais, procurando encontrar-me comigo mesma, passei a dirigir-me algumas vezes à Terra, à Força Criadora, ou a Quem Quer que Fosse que estivesse em outro plano astral e pudesse me ouvir. Às vezes era para agradecer, outras para pedir paciência com o tempo das coisas e dos acontecimentos.

Engraçado contar tudo isso porque fui ensinada a rezar muito cedo, desde pequena. Família católica não-praticante, com avós católicas da roça, daquelas que levam a gente na senhorinha da rua de baixo pra benzer "bucho virado" e dão chá de hortelã com semente de pacová pra curar "as bichas", pai fuçado na umbanda, mãe espírita, tia na Seicho no ie, aprendi desde cedo que rezar é bom - não interessa para quem ou porquê. O melhor é que seja para agradecer - porque mesmo sem querer a gente já pede demais, o tempo todo.

Mas deixei de rezar, durante algum tempo, em algumas fases da minha vida. Nunca abandonei meus santinhos: Nossa Senhora da Aparecida, São Cosme e Damião, São Benedito. Mas eles ficavam lá, feito parente "de longe", que a gente até tem consideração, mas não faz parte do dia-a-dia. Meio assim.

E fui voltando, sem perceber muito o porque também. Como agora. 

Pela primeira vez na vida, tenho vontade de fazer uma prece. Agradecer ao Cosmos, o ao que quer seja e que nome tenha, pelo momento que estou vivendo. Momento, aliás, que não tem nada demais, materialmente falando - não ganhei na Megassena, não vou me casar, não comprei uma casa. Mas tenho experimentado, como há muito não sentia, um sentimento de tranquilidade comigo mesma. Serenidade interna, apesar da roda viva que é o mundo aqui fora.

Eu não sei, de verdade, a quem me dirijo - se está dentro ou fora de mim. Mas pela primeira vez na vida, aquelas frases aprendidas e recitadas desde criança, tem sido ditas por mim com vontade, e, o que é melhor, me fazem sentir bem.

quarta-feira, 21 de julho de 2010

muitas novidades...

... na casa nova, no trabalho novo, na cidade nova...

muita coisa pra aprender. todos os sentidos a postos.

muitos cheiros, muitos sons - música, ruídos, barulhos, sussurros... gostos diferentes, cores, luzes, temperaturas, sensações...

segunda-feira, 19 de julho de 2010

Primeiro final de semana. Chegando...

Depois de passar a sexta-feira toda "morgando", de pijama o dia todo enquanto arrumava as malas, cheguei ontem, em definitivo até sabe Deus quando, a esta cidade maluca.

Vim de carona com um casal de amigos de Bertioga, que rumavam para Catanduva. Saímos às 5h da manhã e chegamos aqui às 7h30, depois de nos perdemos no centro de São Paulo, perdendo (algumas vezes) a entrada para o Elevado.

Eu já havia combinado com os meus queridos de Campinas que nos encontraríamos no show da Carol, na hora do almoço, lá no SESC Vila Mariana, e pra lá fui. Como vim de Bertioga pela manhã, não deu tempo de preparar almoço nem nada decente para receber as visitas... comecei mal esse lance de anfitriã... Mas até que para a primeira vez, guiei bem meu compadre para chegar até aqui - pena que nem em um sábado a tarde o trânsito dê trégua...

Ter duas crianças de 4 e 6 anos em um apartamento pequeno é uma pequena sessão de tortura. Primeiro, explicar e fazê-los entender que estamos em uma casa em cima de outra, e que todo o barulho que fazemos incomoda os vizinhos de baixo. Depois, tentar (inutilmente) evitar que eles pulem, batam os pés no chão, brinquem de lutinha... até que os vizinhos sutilmente reclamem, batendo no teto. É a #vidanoapê...

Hoje foi dia de passar uma vassoura por onde o padre passa, deixar a sala apresentável e meu quarto livre de bagunça, e enfiar toda a bagunça no outro quarto. A Tati foi comigo buscar a tv da Elis, que estava emprestada para a Sylvia e agora ficará comigo, até eu encontrar uma por R$100,00, ou ganhar de presente (aha! alguém se habilita?)!!!
Percebi, no final da noite, que ACABOU-SE A MAMATA DE ALMOÇAR E JANTAR NO TRABALHO, e que preciso criar vergonha na cara e voltar a cozinhar. Até porque estou duranga e preciso fazer o dinheiro chegar até o final do mês (e ainda faltam mais de 10 dias, medo!). Ótima oportunidade para me lembrar de tudo que já pesquisei e acreditei sobre alimentação (a pessoa aqui foi vegetariana por 8 anos, fazia seu próprio gluten, cozinhava diariamente) e deixar de comer tranqueira como venho fazendo há algum tempo (alguém viu a coca-cola que eu deixei na geladeira?).

Operação 30 anos, aí vou  eu! Ou eu como direito, e me esforço para emagrecer e desentortar minha coluna, ou estou fadada a me sentir fracassada para o resto da vida... tenho três anos para ter o corpo e a saúde que desejo (uau, que frase mais revista feminina...), e só eu posso fazer isso por mim. E a dra Marta, se eu fizer a minha parte - não fui nem buscar os resultados dos exames do ano passado...

Pois é, bem vinda a sua nova vida nova!

Impressões de um menino de quatro anos sobre a nova casa da sua madrinha
(descendo do carro)
- Dinda, qual é a sua casa?
- É neste prédio amarelo.
- Este amarelinho, precioso? (essa coisa fofa aprende palavras e fica usando, assim... ai!)
- É, este aqui.
(abro a porta do prédio, e ele entra correndo, na minha frente, enquanto os demais ainda descem do carro)
- Onde é a sua cozinha?
- Sobe a escada, é lá em cima.
(ele sobre correndo, e eu corro atrás, sem escolha; deixo a porta de entrada do prédio aberta)
- Aqui é a porta da sua cozinha?
- Não, aqui é a porta da minha casa.
(olha para o corredor, com cara de intrigado)
- Por que tem tanta portinha na sua casa, Dinda?
- Cada porta é uma casa, a minha é essa. Vamos entrar para você ver.
(entramos, e ele entra correndo, para reconhecer o espaço. Estou na cozinha, descarregando as compras.)
- Dinda, a sua casa não tem cozinha?
- Tem meu amor, é aqui.
(pensa um pouco, intrigado)
- E a sua cozinha não tem cadeira, pra gente sentar e comer comida?

É, meu amor, espero que durante um bom tempo a sua referência de casa seja portão, jardim, garagem, copa, cozinha, quintal, céu... e a sua Dinda promete que da próxima vez vai ter comida pronta, pra você não ficar com tanta fome assim e só querer saber da cozinha...



sábado, 17 de julho de 2010

Tchau, bye, au revoir, ciao...

E agora é definitivo. Estou escrevendo da sala de casa, da minha nova casa, em São Paulo. São 10h da manhã, e desde às 7h30, quando cheguei, o trânsito é constante. Certamente em Bertioga chove e não se ouve mais nada do que o barulho da chuva.

Os sentimentos são todos confusos, e eu não sei falar sobre eles. A despedida entre os queridos amigos da programação foi tranquila, afinal, nos falamos todos pelas redes sociais, e sabemos que continuaremos nos vendo e convivendo. Com os colegas dos outros setores foi diferente, pois a grande maioria das pessoas não se imagina saindo da cidade, muito menos frequentando São Paulo. E depois deste tempo de convivência, graças a Deus temos amigos dos quais nos despedir, e, neste caso, com um gostinho já de saudade.

Tchau, companheiros, tchau, Bertioga, até um dia.

Olá, cidade grande, cá estou eu - o que você me reserva?

quarta-feira, 14 de julho de 2010

Despedida com chuva, só para variar

Um noroeste soprou violento na segunda-feira, e os lindos dias de sol do início deste julho disseram adeus, ao menos pelos próximos 7 dias. Queda de temperatura e chuva intermitente, só para variar um pouquinho.
Amanhã é meu último dia na cidade, e desde que que soube que ia embora, fiquei imaginando despedidas melancólicas. Escrevi vários textos na minha cabeça, reverenciando o mar, conversando com a orla, e buscando as coisas que fizeram sentido em minha vida nestes dois anos - esse mergulho forçado em mim mesma. Mas melancolia, definitivamente, não combina comigo. Nem com a situação.
Não morro de amores por esta cidade, e isso não é segredo para ninguém. Mas não saio daqui "batendo os tamanquinhos", como Carlota Joaquina. Sem mágoas, sem traumas, sem sentimentalismos. Saio daqui levando amizades, dentro e fora da cerca verde (como diria o Fabinho). Vou me embora depois de ter vivenciado a utopia de morar em uma cidade pequena, razoavelmente próxima de um grande centro, e com a certeza de que esse sonho não é para mim (alôôô: nota para o futuro, para não repetir a bobagem). Acabou-se também a utopia de morar na praia, pelo menos no estado de São Paulo: chove demais, a cidade entope na temporada, e não se curte nada. Praia para mim, só como lazer.
Levo comigo o sentimento de não ter vivivo a cidade como poderia, não ter me envolvido, não ter sido daqui de fato: apenas estive, durante estes meses. Mas sabendo que estive da maneira que podia, dentro daquilo que era possível para mim, neste momento da minha vida.
Como toda mudança é um recomeço, sigo planejando uma nova vida a partir da próxima semana: voltar a cozinhar e comer saudavelmente (ahan), sair do sedentarismo em que me joguei (preciso dançar!!!), retomar círculos sociais, voltar a estudar... planos. E é ótimo fazer planos!
Olhando para a garoa lá fora, estou de pijama e morrendo de preguiça de sair de casa. Sei que chove também em São Paulo, e a paisagem é bem menos bucólica do que a que tenho agora. É só mais uma manhã típica de inverno no litoral, bem parecida com as que devo ter daqui para frente. Com a mesma preguiça, certamente.


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domingo, 11 de julho de 2010

Balanço

Sinto como se tivesse ganhado dois anos para balanço. Dois anos para fechar a casa, descer as prateleiras, contar estoque, avaliar o material, descartar, renovar, repaginar, antes de reabrir.

Engraçado como só se consegue perceber isso quando já foi. Enquanto estamos no meio do caminho, no olho do furacão, parece insuportável. Por várias vezes, achei que não ia aguentar. A cidade pequena, a distância da família, a ausência dos amigos. A falta de infraestrutura, sem rede social, sem rede cultural. Achei que ia pirar, muitas vezes. Chorei, me descabelei.

E hoje, cá estou.

Se eu fosse adepta da meditação, talvez não tivesse entrado tão profundamente nisso. Não foi planejado, pensado. Foi orgânico, visceral. Tive de vivê-lo sem escolhas.

E é isso. Nova fase, novos caminhos. E lá vamos nós.

Rumo ao turbilhão, à loucura coletiva, ao caos. Ao princípio.

E que outra vida, interligada à anterior, tendo o balanço no meio, comece.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Reflexões sobre o fantástico...

Estou mais do que sumida desta blog, embora tenha escrito vários e vários posts... na minha cabeça, enquanto vivo todas estas mudanças intensas que vêm acontecendo nas últimas semanas. Impressões sobre a cidade grande, balanços sobre a cidade pequena, reencontros, expectativas... estou quase me convencendo que preciso de um celular com editor de texto, assim não perderia as idéias. Ou um gravador de voz (vou parecer mais maluca do que nunca, falando sozinha pela rua, hahahaha), já que a tendinite do braço esquerdo não me deixa, e o braço direito começou a reclamar também - e já bastam as muitas horas de computador no trabalho.

Bom, de qualquer forma, sem comentar os resultados da Copa do Mundo que se despede este domingo - e, agradecendo, de certa forma, que a vida tenha voltado ao curso normal alguns dias mais cedo graças ao Dunga e à CBF - li este texto do Luiz Guilherme Piva, publicado hoje no Blog do Torero, e resolvi compartilhá-lo.


O fantástico só o é se ficar na imaginação...

 

Brasil e Argentina na final? Nunca!

 Luiz Guilherme Piva

O lado bom das derrotas: não haverá a final entre Brasil e Argentina nesta Copa. E tomara que não haja em nenhuma Copa. Certas coisas devem existir somente como possibilidade. Temidas ou desejadas ao extremo, elas são muito melhores – corrijo: elas só são boas, ótimas, maravilhosas – quando pensadas: “Já imaginou se?”, “só de pensar me dá um troço esquisito”, “nunca mais o mundo será o mesmo” – e por aí. São sensações que valem dessa forma. A coisa imaginada, desejada, temida, não deve ocorrer. Porque extinguiria o que a idéia tem de supremo. Porque a realidade será muito menor do que seria quando somente imaginada.

Ganhar na loteria sozinho é um bom exemplo. Problemas com aplicações, parentes, seguranças. Prazeres vãos do consumo e da carne. E lá se vai o sabor incomparável de deitar pensando em como seria se seu bilhete fosse o único premiado. O sorriso no travesseiro antes da babinha alegre do sonho inatingível. Outro exemplo: virar o melhor jogador de futebol do mundo. Ou o cantor, ator, escritor ou cientista mais admirado e famoso do mundo. Sono pesado, de olhos fechados ou abertos, e um prazer imenso.

Exemplos de temor: a guerra aberta entre EUA e China, ou Rússia, ou Oriente. A bomba atômica de efeito global. A invasão da terra por marcianos malévolos. Choque entre planetas. A fome, a praga, a peste, o fogo – corroendo tudo. Insônia, olhos arregalados, pavor. Que nada disso aconteça é muito melhor.

Uma final de Copa do Mundo entre Brasil e Argentina está nesta categoria de coisas que não podem ocorrer. Devem ser imaginadas. Temida ou desejada, ela é muito melhor – corrijo: só é fantástica – assim: não acontecendo jamais. Se ocorrer, com sua mesquinhez de lances reais, com o fatídico resultado concreto, com as versões, teipes e discussões, tudo perderá tensão, prazer, pavor. Que joguem em amistosos, torneios, eliminatórias, que se matem e se amem em qualquer lugar – até em semi-finais de Copa, se preciso. Mas em final de Copa, não.

Devem seguir o exemplo de América e Pombense, de Rio Pomba, em Minas. Rivais mortais e fraternos, só jogaram duas vezes entre si em mais de cem anos. Uma no início e outra no final do século XX. Foram dois empates - se não me engano, sem gols. E a cidade, pequena, se agiganta de prazer e pavor imaginando o que seria se voltassem a se confrontar. Mas todos sabem que isso não deverá e não poderá ocorrer. Preferem até que haja a guerra mundial, o choque entre planetas, a fome e a peste, a cura de todas as doenças.

Estou com eles. Tudo, menos a final de Copa entre Brasil e Argentina.

[Luiz Guilherme Piva, economista, é autor dos livros "Ladrilhadores e Semeadores" (Editora 34) e "A Miséria da Economia e da Política" (Manole).]

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Em processo

Este blog está abandonado, porque as mudanças e processos tem sido muitos e muito intensos, não está sobrando tempo para nada. Nem vim aqui comemorar a vitória do Santos.

(Santos Campeão Paulista 2010!!! O melhor!!! 
Viva a molecada da Vila Belmiro!!!)

Pronto. Comemorado. E chupa Luxemburgo!

Passei o final de semana em São Paulo, faxinando e dedetizando o apê por minha própria conta e risco (!!!). Graças à ajuda fundamental das queridas Ana e Tati, pude fazer em etapas e não me envenenar junto, hahaha. Limpamos os armários na sexta-feira e, surpresa: encontramos cupim em um dos armários. Se euzinha aqui já sou pouco neurótica com bichinhos, insetos e outros seres nojentos, sabendo da existência de cupins comendo o armário, quase surtei.

No sábado, lavei o chão, apliquei K-Othrine (é assim que se escreve?) no chão, rodapés, batentes, etc... Fiquei algumas horas no apê, e foi muito legal para perceber o movimento da região, me ambientar. Era sábado, primeiro de maio, feriado. O trânsito do entorno? Caos total. Show no Memorial, show de música sertaneja em outro local da Barra Funda, encontrão religioso na igreja Brasil para Cristo na quadra de casa. Era "Aleluia" de um lado e "Você diz que não me ama, você diz que não me quer"  do outro... buzinas, ruas fechadas, motorista braço... olha, muito prazer, São Paulo! A Ana levou mais de uma hora pra chegar das Perdizes em casa!!!

No domingo, fui pro apê munida de veneno para cupim, luva, máscara... apliquei nos armários (adeus, bichinhos!!!) e saí correndo para a rua, porque o cheiro é horrível!!! Fui ao supermercado e comprei, adivinha??? Veneno para barata, aquelas iscas, que tem longa duração. Daí me dei conta que estava já no processo neurose e era hora de parar, porque quando começa... sem retorno.

Pra aliviar, comprei cerveja e salgadinho para esperar o Nilson que ia passar para me pegar e descermos juntos para Santos.

Sexta-feira vou receber o caminhão de mudança. Daí pra frente, a casa começa a ter a minha cara. Não aguento mais esperar.

PS: quero comprar uma tv usada, alguma sugestão?

domingo, 11 de abril de 2010

Sobre verdades e mentiras


"...Pode a verdade estar na boca das crianças,
mas para a dizerem têm que crescer primeiro, e então
passam a mentir..."
(Memorial do Convento - José Saramago)

sábado, 10 de abril de 2010

Clariceando

"Eu queria escrever um livro. Mas onde estão as palavras? Esgotaram-se os significados. Como surdos e mudos comunicamo-nos com as mãos. Eu queria que me dessem licença para eu escrever ao som harpejado e agreste a sucata da palavra. E prescindir de ser discursivo. Assim: poluição.

Escrevo ou não escrevo?

Saber desistir. Abandonar ou não abandonar - esta é muitas vezes a questão para um jogador. A arte de abandonar não é ensinada a ninguém. E está longe de ser rara a situação angustiosa em que devo decidir se há algum sentido em prosseguir jogando. Serei capaz de abandonar novamente? Ou sou daqueles que prosseguem teimosamente esperando que aconteça alguma coisa? Como, digamos, o próprio fim do mundo? Ou seja lá o que for, como a minha morte súbita, hipótese que tornaria supérflua a minha desistência?


Eu não quero apostar corrida comigo mesmo. Um fato. O que é que se torna um fato? Devo-me interessar pelo acontecimento? Será que desço tanto a ponto de encher as páginas com informações sobre os "fatos"? Devo imaginar uma história ou dou largas à inspiração caótica? Tanta falsa inspiração. E quando vem a verdadeira e eu não tomo conhecimento dela? Será horrível demais querer se aproximar dentro de si mesmo do límpido eu? Sim, e é quando o eu passa a não existir mais, a não reivindicar nada, passa a fazer parte da árvore da vida – é isso que luto por alcançar. Esquecer-se de si mesmo e, no entanto viver tão intensamente.

Tenho medo de escrever. É tão perigoso. Quem tentou, sabe. Perigo de mexer no que está oculto - e o mundo não está à tona, está oculto em suas raízes submersas em profundidades do mar. Para escrever tenho que me colocar no vazio. Neste vazio é que existo intuitivamente. Mas é um vazio terrivelmente perigoso: dele arranco sangue. Sou um escritor que tem medo da cilada das palavras: as palavras que digo escondem outras - quais? Talvez as diga. Escrever é uma pedra lançada no poço fundo.

Meditação leve e terna sobre o nada. Escrevo quase que totalmente liberto de meu corpo. É como se este estivesse em levitação. Meu espírito está vazio por causa de tanta felicidade. Estou tendo uma liberdade íntima que só se compara a um cavalgar sem destino pelos campos afora. Estou livre de destino. Será o meu destino alcançar a liberdade? Não há não há uma ruga no meu espírito que se espraia em leves espumas. Não estou mais acossado. Isto é a graça.

Estou ouvindo música. Debussy usa as espumas do mar morrendo na areia, refluindo e fluindo. Bach é matemático. Mozart é o divino impessoal. Chopin conta a sua vida mais íntima. Schoenberg, através de seu eu, atinge o clássico eu de todo o mundo. Beethoven é a emulsão humana em tempestade procurando o divino e só o alcançando na morte. Quanto a mim, que não peço música, só chego ao limiar da palavra nova. Sem coragem de expô-la. Meu vocabulário é triste e às vezes wagneriano-polifônico-paranóico. Escrevo muito simples e muito nu. Por isso fere. Sou uma paisagem cinzenta e azul. Elevo-me na fonte seca e na luz fria.

Quero escrever esquálido e estrutural como o resultado de esquadros, compassos e agudos ângulos de estreito enigmático triângulo.

"Escrever" existe por si mesmo? Não. É apenas o reflexo de uma coisa que pergunta. Eu trabalho com o inesperado. Escrevo como escrevo sem saber como e por quê - é por fatalidade de voz. O meu timbre sou eu. Escrever é uma indagação. É assim:?

Será que estou me traindo? Será que estou desviando o curso de um rio? Tenho que ter confiança nesse rio abundante. Ou será que ponho uma barreira no curso do rio? Tento abrir as comportas, quero ver a água jorrar com ímpeto. Quero que cada frase deste livro seja um clímax.

Eu tenho que ter paciência, pois os frutos serão surpreendentes...

Este é um livro silencioso. E fala, fala baixo.

Este é um livro fresco - recém saído do nada. Ele é tocado ao piano delicada e firmemente ao piano e todas as notas são límpidas e perfeitas, umas separadas das outras. Este livro é um pombo - correio. Eu escrevo para nada e para ninguém. Se alguém me ler será por conta própria e auto-risco. Eu não faço literatura: eu apenas vivo ao correr do tempo. O resultado fatal de eu viver é o ato de escrever. Há tantos anos me perdi de vista que hesito em procurar me encontrar. Estou com medo de começar. Existir me dá às vezes tal taquicardia. Eu tenho tanto medo de ser eu. Sou tão perigoso. Me deram um nome e me alienaram de mim.

Sinto que não estou escrevendo ainda. Pressinto e quero um linguajar mais fantasioso, mais exato, com maior arroubo, fazendo espirais no ar.

Cada novo livro é uma viagem. Só que é uma viagem de olhos vendados em mares nunca dantes revelados - a mordaça nos olhos, o terror da escuridão é total. Quando sinto uma inspiração, morro de medo porque sei que de novo vou viajar e sozinho num mundo que me repele (...) As minhas limitações dão a matéria-prima a ser trabalhada enquanto não se atinge o objetivo".   
                                         
                        
Clarice Lispector, Um Sopro de Vida.

(encontrei entre os meus guardados, oferecido por uma pessoa muito querida, há alguns anos atrás)

sexta-feira, 9 de abril de 2010

Boneca de crochê, para esquentar um dia cinzento

Os acontecimentos conturbados dos últimos dias têm me impedido de escrever (e estão condenando este blog a uma morte lenta e dolorosa). Hoje, aproveitando o dia de folga e muita (mas muita mesmo!) chuva, limpei arquivos e caixas de e-mail, e encontrei este texto engraçadinho, que me foi enviado pela querida Simone, quando eu ainda era casada.

Bom, o casamento acabou, mas a história continua tendo seu fundo de verdade, hahaha! Aviso ao próximo maluco que se colocar no meu caminho que ele será um homem de sorte, porque eu sei fazer crochê!!!

BONECA DE CROCHÊ

Um homem e uma mulher estavam casados por mais de 60 anos. Eles tinham compartilhado tudo um com o outro. Eles tinham conversado sobre tudo. Eles não tinham segredo entre eles, afora uma caixa de sapato que a mulher guardava em cima de um armário, e tinha avisado ao marido que nunca abrisse aquela caixa e nem perguntasse o que havia nela. Assim por todos aqueles anos ele nunca nem pensou sobre o que estaria naquela caixa de sapato. Mas um dia a velhinha ficou muito doente e o médico falou que ela não sobreviveria. Visto isso, o velhinho tirou  a caixa de cima do armário e a levou pra perto da cama da mulher. Ela concordou que era a hora dele saber o que havia naquela caixa. Quando ele abriu a tal caixa, viu 2 bonecas de crochê e um pacote de dinheiro que totalizava 95 mil dólares.

 Ele perguntou a ela o que aquilo significava; ela explicou:

 - Quando nós nos casamos, minha avó me disse que o segredo de um casamento feliz é nunca argumentar/brigar por nada. E se alguma vez eu ficasse com raiva de você que eu ficasse quieta e fizesse uma boneca de crochê.

 O velhinho ficou tão emocionado que teve que conter as lágrimas enquanto pensava 'Somente 2 bonecas preciosas estavam na caixa. Ela ficou com raiva de mim somente 2 vezes por todos esses anos de vida e amor.'

 -  Querida!!! - ele falou - Você me explicou sobre as bonecas, mas e esse dinheiro todo de onde veio?

 - Ah!!! - ela disse - Esse é o dinheiro que eu fiz com a venda das bonecas.

 PRECE

Senhor, dai-me sabedoria para entender meu marido, amor para perdoá-lo e paciência para aturá-lo. Senhor, porque se eu pedir força, eu bato nele até matar,  porque eu não sei fazer crochê.  

quinta-feira, 11 de março de 2010

Deusas do Cotidiano - Sérgio Vaz

"De todos os hinos entoados em louvor às revoluções nos campos de batalhas, nenhum, por mais belo que seja, tem a força das canções de ninar cantada no colo das mães." 
.
O nome dessas mulheres eu não sei, não lembro e nem preciso saber. São nomes comuns em meio a tantos outros espalhados por esse chão duro chamado Brasil.
Mas a maioria delas eu conheço bem, são donas de um mesmo destino: as miseráveis que roubam remédios para aliviar as angústias dos filhos. É quando a pobreza não é dor, é angústia também. São as ladras de Victor Hugo.
Donas da insustentável leveza do ser, as infantes guerreiras enfrentam a lei da gravidade. Permanecem de pé ante aos dragões comedores de sonhos que escondem na gravidade da lei.
Das trincheiras do ninho enfrentam moinhos de mós afiadas para protegerem a pança dos pequeninos. São as Quixotes de Miguel de Cervantes.
Místicas, não raro, estão sempre nuas em sentimentos. Quando precisam, cruas, esmolam com o corpo, e se postam à espera do punhal do prazer que cravam no seu ventre. È quando o prazer humilha. São as habitantes do inferno de Dante.
Rainhas de castelos de madeiras, sustentam os filhos como príncipes, e os protegem da fome, do frio, e da vida dura e cruel que insiste em bater na porta das mulheres de panela vazia. Quanto aos reis, também são os mesmos: os covardes dos vinhos da ira.
Mágicas, esses anjos se transformam em rochas, quando a vida pede grão de areia. Em flores quando rastejam, em espinhos quando protegem.
Essas mulheres são aquelas que limpam tapetes, mas não admitem serem pisadas.
Riscam papéis, limpam máquinas e consertam crianças que nascem com o sonho quebrado.
São domésticas, mas não admitem serem domesticadas.
E riem quando suam sob lágrimas e sangram o perfume da violeta impune estampada no rosto, que de rosa, não tem nada.
Sim, elas são as deusas do dia a dia.

Realidade com poesia, para encarar a semana.

segunda-feira, 8 de março de 2010

8 de março

Adélia Prado, Com licença poética

Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo.  Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
— dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.

Pelo Dia Internacional da Mulher.

domingo, 7 de março de 2010

Em ritmo de mudança

Mais um final de semana (de folga) chuvoso que, parece, vai-se embora. Estou aqui às voltas com a minha preguiça de sair de casa e ir até a padaria, e as limitadas opções para o lanche, já que estamos em contagem regressiva para a mudança.

Desde que decidimos desfazer a república, no final do ano, venho preparando aos poucos a mudança. Limpeza no guarda-roupa, organização dos materiais da faculdade e do mestrado (aiaiaiaiai...), geral nos livros e nas revistas de coleção, geral nos meus brinquedos de coleção... Consegui, nos intervalos do dia-a-dia, arrumar uma boa parte das coisas. Até a pasta dos meus documentos, comprovantes de experiência profissional, e manuais e notas fiscais de eletrodomésticos eu arrumei como nunca antes na história dessa pessoa!!!

Com as alterações nos rumos iniciais desse "desfazimento" da república, tive que correr para comprar geladeira e fogão antes do fim do desconto do IPI - e esperar muito mais do que o previsto pela entrega -, preparar algumas coisas para ficarem guardadas por um tempo - lavei tapetes, cortinas, roupa de cama, toalhas, casacos que nunca vesti em Bertioga... 

Agora que a transferência do Nilson é uma realidade com data marcada - daqui a 7 dias -, o tempo está urgindo. Ontem meus pais estiveram aqui, levando minhas plantinhas para uma temporada em Jacareí, e o meu aparelho de som, para não correr o risco de ficar desligado ao sabor da maresia aqui. Aproveitei para dar uma geral da dispensa, e levamos uma cesta de presente para o Juara e o Emerson, que ontem inauguraram uma nova república da firma em Bertioga. Até 4ª feira temos que esvaziar a geladeira, para dar tempo de desligar, secar direitinho e embalar longe do mofo (argh!). Não vou nem contar o que ainda temos na geladeira...

Aos poucos vamos nos despedindo da cidade, das chuvas tão peculiares, do mar e dos amigos. Eu ainda fico por aqui um tempo, mas já no esquema "provisório"...  Meu desafio para os próximos dias é organizar uma mala com o mínimo de roupas, sapatos e acessórios para sobreviver no sobe-e-desce serra por pelo menos 30 dias (Aha! E quem disse que eu vou conseguir?!?) A casa está com aquela cara de bagunça, meio caótica, e, para mim, é como se um filme desses dois anos fosse se reorganizando e ganhando novos significados à medida que as caixas vão sendo empilhadas.

Expectativas, balanços, apreensão, melancolia... a gente devia se mudar de casa e de cidade com mais frequência, para poder pensar na vida mais vezes... ;-)

sábado, 27 de fevereiro de 2010

Inferno Astral

Nunca acreditei muito nos tais dias de inferno astral, nos quais, supostamente, tudo tende a dar errado em nossos caminhos. Nos últimos anos, estes têm sido períodos de decisões e encaminhamentos decisivos para os próximos dias do ano - talvez porque coincidam com o período pós-carnaval, e este seja o momento de todo o mundo tomar providências para encaminhar os próximos 10 ou 9 meses do ano.

A verdade é que já há algum tempo, fevereiro tem sido um mês agitado para mim - para o bem. E este ano não se mostrou diferente. Mudança de casa, quem sabe de cidade, reviravolta no trabalho, novos ciclos se iniciando. Um misto de expectativa, alegria e apreensão tem tomado conta dos meus sentimentos, tornando o dia-a-dia um pouco arrastado. Sinto-me meio aérea, fazendo balanços passados, cálculos futuros, revendo planejamentos, recomeçando sonhos.

Desde sempre sou um pouco como a "menina do leite", que sonha tanto com o futuro antes de vender o primeiro litro de leite, que o derrama e tem que começar de novo. Isso me fez aprender a ser mais cautelosa, e aguardar os acontecimentos - daí o sentimento de apreensão, que tem sido maior do que o de expectativa. Assusta-me, e muito, saber que as pessoas têm expectativas a meu respeito. "A expectativa é a mãe da frustração", já me disse alguém um dia.

Enfim, novidades virão nos próximos dias. Por hora, só posso dizer que não estou conseguindo cumprir a promessa de ler um livro por semana, pois eles já estão encaixotados, hahahaha. A meta agora é encaixotar uma boa parte das coisas por semana, e aí se vai o meu tempo livre (certo, Melqui? ;-) )... A única leitura deste mês, além das palavras cruzadas, foi a biografia da Maysa - Só numa multidão de amores, de Lira Neto, que ganhei há algum tempo da Mayra e não havia lido ainda. Ainda volto aqui para falar desse furacão que é a biografia de Maysa. Ne me quitte pas...

Está um sábado lindo de sol lá fora, choveu muito nos últimos dias e eu vou voltar às minhas caixas e fitas adesivas.

O inferno são os outros.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

O Sonho de Ícaro


Uma homenagem mais do que justa, meu coração vai junto com o bloco, na próxima segunda-feira.

Lucas querido, suas asas são maiores do que o samba que a gente é capaz de cantar.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Fragilidade contemporânea

Voltou a chover em Bertioga, com a graça dos céus. Foram dez dias de sol intenso, calor insano, 40º à sombra, pessoas morrendo de calor, sinal dos tempos.

Sinal dos tempos também é se dar conta da fragilidade à qual estamos expostos neste mundão. Sinal dos tempos, ou sinal de que o tempo passa e a gente se dá conta de que não é infalível, e as coisas acontecem com gente como a gente também.

Ainda estou digerindo a notícia de que uma grande amiga foi assaltada em sua própria casa. Chegou do trabalho depois do almoço, estava na sala, às 13h30, com as portas e janelas abertas, cuidando de seus afazeres. Foi surpreendida por 3 assaltantes armados, em busca de dinheiro e jóias. Amarraram seus pés e suas mãos, a amordaçaram, e, então, se deram conta que numa casa de fundos em um bairro popular não encontrariam as jóias que alguém encomendara. Mas, como não podiam perder a viagem, levaram o pouco dinheiro que ela tinha na carteira, tv, máquina fotográfica, o computador de trabalho e o carro. Ela ficou amarrada por cerca de 3 horas, até que um vizinho ouvisse seus gritos e a socorresse.

Recebi a notícia por um amigo em comum, enquanto estava no trabalho, e fiquei chocada. Comentei com colegas de sala, e o comentário imediato foi: "é, realmente é muito perigoso morar sozinha, em uma casa. É bom que você se cuide mais também."

Acho que o comentário me deixa mais chocada ainda.

Eu vivo sozinha há algum tempo. Sempre dividi casa com algum companheiro, como agora, mas sempre estou sozinha em casa - principalmente à noite. Trabalho à noite, chego tarde em casa, e assim é a vida. Recuso-me, terminantemente, a ter medo desta situação, que, aliás, demonstra minhas vitórias no mundo: sou uma mulher solteira, tenho meu emprego, economicamente independente, emocionalmente resolvida, não devo satisfação para ninguém. Uso e abuso do meu direito de ir-e-vir, e DETESTO quando me cobram por notícias, itinerários, caminhos, etc...

Por isso, fiquei pensando quanto tempo levaria até alguém dar pela minha falta caso algo me acontecesse (fico mais de uma semana sem ligar para minha mãe...). Nem sei se os vizinhos notariam algo estranho.

Termino a noite indignada, mais uma vez com os problemas sociais deste país, a violência, a ineficácia do poder público, a falta de confiança na polícia, mas também repensando os modos como me coloco no mundo, e que escolhas são essas que nos deixam mais frágeis, mais vulneráveis, mais isolados. Chamar de mal contemporâneo é simplificar demais.


sábado, 6 de fevereiro de 2010

Verão intenso demais


O calor que fez por aqui nos últimos dias é qualquer coisa assustadora. Impossível sair de casa, impossível tomar banho quente, impossível beber qualquer líquido que não esteja gelado. O ventilador - que nem é nosso - fica ligado o tempo todo. Só durmo com a janela do quarto aberta, e me peguei desejando ter ar-condicionado em casa!

Estou na janela, vendo o movimento dos turistas seguindo para a praia. Com esta lua, só turista vai à praia. Turista, e morador que trabalha para turista. Esta semana chegou a faltar coco verde nas barraquinhas da praia e nos restaurantes.

Guardassóis (é esta a grafia correta?), cadeiras, esteiras, barracas. Protetor solar e cerveja. Gente com a pele cor-de-rosa do excesso de sol de ontem, crianças de chapéu e camiseta. Estas cenas me dão preguiça do mundo lá fora.

Definitivamente, meu tempo nesta terra já venceu. Quero desejar a praia uma vez ao ano, não quero mais olhar para ela todos os dias. Quero ser turista.

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Livros - promessa de ano novo

Fiz uma promessa de ano novo, daquelas que raramente nos dão prazer em cumprir.

(fiz outras, não tão saborosas, mas deixa pra lá...)

Prometi a mim mesma ler um livro por semana. São poucas as coisas no mundo que me satisfazem mais do que a companhia de um bom livro, e é irritante como a gente vai deixando de ter tempo para a leitura. Quanto tempo eu perco em navegações sem rumo pela web!

Como o mês de janeiro acabou, hora de fazer o balanço de leituras das últimas 5 semanas:

- Nunca antes na história deste país, do Marcelo Tas.
Li no primeiro dia do ano, num misto de diversão, perplexidade e tristeza. O livro é sim, divertido, na cuidadosa seleção de frases do presidente Lula, selecionadas por Tas, na diagramação bonita, no encadeamento das "profissões" do presidente. Mas não consigo morrer de rir, como muitos seguidores do @marcelotas no Twitter, principalmente sabendo que temos eleições este ano, e o quadro não é nada animador...

- Canalha!, do Fabrício Carpinejar.
Delicioso. Deliciosamente canalha... Conhecia a poesia do Carpinejar, em Cinco Marias, que me tirou o fôlego numa só manhã. Com este fui me deliciando ao longo de vários dias, um pouquinho a cada dia. Altamente recomendado.

- Yuxin, da Ana Miranda.
É a primeira vez que tomo contato com a literatura de Ana Miranda. Sinceramente, não foi um encontro feliz. Confesso que só terminei o livro porque não gosto de deixar pela metade.

- Contos Negreiros, do Marcelino Freire.
Leitura de uma noite, num só fôlego. Assunto pra pensar por muito, muito tempo. Imagens para retomar, em momento oportuno.

- O cheiro do ralo, do Lourenço Mutarelli.
Narrativa com ritmo, envolvente, divertida, imagética. Ainda não vi o filme, mas fiquei curiosa para saber como os conflitos psicológicos do narrador são resolvidos na película.

É, acho que o balanço no geral é bom. Vamos ver se o ritmo e a sede se mantém pelos próximos meses. Tô apostando na rede de trocas do Trocando Livros - cadastrei alguns lá hoje; e nos achados da Estante Virtual - tenho dois do Quintana, recém chegados, à minha espera.

Por hoje chega, que daqui a pouco é hora de levantar. Boa noite!

Blog pra quê?

Já comecei e parei, já retomei e desisti.

Blog pra quê? Escrever pra quê?

Quis ser jornalista, aos 10 anos de idade. Aos 16, resolvi ser cientista social, pra escrever "com conteúdo". Os anos na universidade bloquearam a escrita, e depois me fizeram descobrir que era preciso pensar em quem estava do outro lado, lendo.
De leitora ávida por livros, fui me tornando leitora da rede. Sou da geração que foi, aos poucos, misturando diário secreto com internet, público e privado, solidariedade e exposição.

E-mail, e-groups, blog, ning, orkut, twitter. Tá tudo aí, junto-e-misturado. E o jeito de pensar - e escrever - foi mudando.

Registrar as idéias é necessário - para não perdê-las pelo meio do caminho. Compartilhá-las - quase imperativo.

Serei constante? Duvido.

Mas vou tentar. De novo.